quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

FESTA

Ele está sentado, olhando as próprias pernas. Como são finas e sem pêlos as minhas pernas, ele pensa. Suas mãos descansam sobre o assento do sofá. Sua filha passa para lá e para cá, dando os últimos retoques na casa. Daqui a pouco vão chegar umas pessoas que eu não conheço, e outros que conheço pouco, e uns poucos que conheço bem, e todos, sem exceção, primeiro vão me olhar de longe, mais ou menos como se não tivessem me visto, pensando no que vão dizer. Cumprimentarão minha filha e meu genro e perguntarão pelo meu neto, e ouvirão que ele está no quintal, brincando. Depois, com a ideia mais ou menos formada (Vamos abordá-lo assim ou assado), vão se dirigir a mim com dois tipos de cara, as únicas possíveis: a compungida mas falsamente reconfortadora e a reconfortadora claramente compungida. Alguns mencionarão o assunto, dirão que esta é a vontade de Deus; outros não dirão nada; quer dizer, dirão amenidades. Queria estar em casa, sozinho. De que modo a casa fica sem mim? Tenho pena da televisão desligada, das janelas fechadas, da cama forrada. A filha passa esbaforida com um conjunto de travessas e diz, sem parar: Vou buscar seu neto, papai; vou trazer ele aqui pra vocês brincarem. Ele pensa: Não quero brincar com meu neto. Não tenho nada a dizer a ele. Sente um súbito cansaço da festa que ainda não começou. Vai ser muito ruim mais tarde, ao encontrar tudo às escuras. Não seria tão ruim se já estivesse em casa, vendo a noite cair sobre os móveis. O ruim, ruim mesmo, é chegar em casa e encontrar tudo às escuras. Abrirei o portão enquanto minha filha espera dentro do carro, sentada no banco do passageiro, como sempre. O genro, ao volante, parecerá impaciente. E o neto, como sempre, dormirá no banco de trás. Vai ser tão difícil. E suspira, resignado.

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