quarta-feira, 30 de maio de 2012

RUÍNAS

“Imagine estas ruínas à noite”, ela me diz. “Imagine estas colunas que hoje já não sustentam mais nada, estas três colunas, por exemplo. Não é verdade que já não sustentam mais nada, sustentam um friso inútil, que vem de lugar nenhum e vai dar em lugar nenhum. Imagine”, ela continua, sem me olhar, olhando para cima, para o friso ou para o céu azul, “imagine”, ela me diz, “a lua lá no alto e tudo isto aqui vazio, ninguém, nenhum destes turistas barulhentos”, e faz um gesto para incluir os turistas barulhentos sem olhá-los, “a lua lá no alto e o silêncio, o silêncio destas ruínas à noite, a luz tão branca da lua lançando sombras, já pensou”, ela me pergunta, “a lua lançando sombras no chão ao projetar-se sobre estas colunas, sobre estes arcos, a pedra fria, branca.” E eu olho ao redor, observo os turistas barulhentos, os turistas com suas bolsas a tiracolo, frenéticos em busca de mais uma foto, apontando, se acompanhados, aquela abóbada, aqueles arcos, aquelas janelas, apontando para o amigo ou esposa ou mãe ou pai, tão embasbacados como eles, aquelas magníficas ruínas, ou, se sozinhos, mirando absortos as ruínas, como que perdidos, como que procurando localizar-se, apenas mirando absortos aquela abóbada, aqueles arcos, aquelas janelas para as quais não precisam apontar pois não há quem siga seu dedo. Volto-me para ela. Continua falando mas eu já não a ouço, prefiro imaginar, como ela pediu, imagino aquilo tudo à noite, a luz branca da lua derramando-se fantasmagórica sobre as colunas, seriam coríntias aquelas colunas, seria aquilo um capitel, e logo imagino os turistas, os barulhentos turistas, tão felizes, tão pacificados, tão satisfeitos em sua superficialidade, imagino esses rebanhos escoando-se lentamente em direção aos hotéis, imagino-os já no banho, alguns deles já na cama, alguns deles já na cama, sim, e tudo isto aqui vazio e solitário e branco como a luz da lua. Ela silencia, olhando ao redor. Nós também voltaremos para o hotel, penso, voltaremos como os turistas barulhentos, voltaremos lentos, cansados, bovinos. Mas duvido que satisfeitos, duvido que pacificados.

Nenhum comentário:

Postar um comentário