terça-feira, 13 de dezembro de 2011

HARUKI MURAKAMI

Haruki Murakami escreve sempre os mesmos livros. (Desconfio que todos os escritores escrevem sempre os mesmos livros, mesmo aqueles que, no livro seguinte, escrevem uma história completamente diferente.) Haruki Murakami não tem vergonha de escrever sempre os mesmos livros. Mesmo os seus contos são todos um conto só. E o que é mais curioso: nos livros e nos contos de Murakami não acontece nada. Quer dizer, acontece, só que de modo gradual, como a maioria das coisas da vida. Na vida, se a gente for reparar, não são comuns as grandes reviravoltas. Nos livros de Murakami, como na vida, as coisas vão acontecendo como um dia atrás do outro. Os personagens de Murakami, silenciosos, inadaptados, não fazem outra coisa senão sentar-se à mesa de cafés, tomar metrôs, caminhar pela cidade e conversar. Conversar sempre e mais um pouco. Aonde vai dar tanta conversa?, a gente se pergunta. Mas, como é uma boa conversa, a gente não se entedia. Eles estão sentados num bar, de madrugada, ou numa cafeteria, e é como se você estivesse na mesa ao lado, tomando um café e lendo um livro. (Faça um exercício de imaginação e convença-se de que você está sentado à mesa da cafeteria – uma mesa com tampo de fórmica – lendo um livro de Haruki Murakami. Para completar o cenário, imagine também que a cafeteria tem portas de vidro e, no teto, luzes fluorescentes. Não se preocupe: tal como você, os personagens de Murakami quase sempre andam com um livro debaixo do braço.) Você está lendo, então. E aí, entre um parágrafo e outro, você escuta a conversa dos personagens. E você se interessa. Você quer saber aonde essa conversa vai dar. É assim que os livros de Haruki Murakami funcionam. É assim que ele nos prende. Mas aonde essa conversa vai dar, afinal? Vai dar em nós, na essência das nossas experiências. Na nossa dor e na nossa solidão. Na estranheza que é este mundo. Enquanto lê (ou ouve), você vai se aproximando de alguma verdade – e vai se incomodando. E então você percebe, sem saber como, que chegou lá. O livro chegou lá. Nada aconteceu, mas aconteceu tudo que tinha que acontecer. Um exemplo. Lá para o final de Norwegian Wood, que terminei dia desses, esta frase me estremeceu: “As coisas fluem para onde têm que fluir, e por mais que você se esforce e tente fazer o melhor possível, quando chega o momento de ferir alguém, você fere.” Assim, fora do contexto, a frase é uma obviedade. Mas no livro – ah, no livro – ela tem um poder tremendo. Quase impossível sair ileso.

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